quarta-feira, 12 de novembro de 2014

A música das almas

Vista da janela de casa                                                                                                                                               Foto: Vilma Gama
Somos mais que corpo, mais que somente o visível, mais que matéria. Somos sentimento, sonho, possibilidade. Gostamos de música e o poeta Vinícius de Moraes fala sobre ela.


                         "A música das almas"


Na manhã infinita as nuvens surgiram como a loucura numa

                                                                                   [alma

E o vento como o instinto desceu os braços das árvores que

                                                         [estragularam a terra...

Depois veio a claridade, os grandes céus, a paz dos 

campos...

Mas nos caminhos todos choravam com os rostos levados 

para   

                                                                                 [o alto

Porque a vida tinha misteriosamente passado na tormenta."



                                                  

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Aviso aos náufragos

Registro do amanhecer                                                                                                                Foto: Victor Luís Gama Rodrigues

O recado é do poeta Paulo Leminski, do livro Toda Poesia.


aviso aos náufragos

    "Esta página, por exemplo,

não nasceu para ser lida.

     Nasceu para ser pálida,

um mero plágio da Ilíada,

     alguma coisa que cala,

folha que volta pro galho,

    muito depois de caída.




    Nasceu para ser praia,

quem sabe Andrômeda, Antártida,

    Himalaia, sílaba sentida,

nasceu para ser última

    a que não nasceu ainda.



    Palavras trazidas de longe

pelas águas do Nilo,

    um dia, esta página, papiro,

vai ter que ser traduzida,

    para o símbolo, para o sânscrito,

para todos os dialetos da Índia,

    vai ter que dizer bom dia

ao que só se diz ao pé do ouvido,

    vai ter que ser a brusca pedra

onde alguém deixou cair o vidro.

    Não é assim que é a vida?"


segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Casa


Sobre o encantador "O paraíso são os outros", de Valter Hugo Mãe:


"Eu adoraria ver jacarés, ursos brancos ou cobras de dez metros. Uma vizinha da nossa rua tem uma vaidosa galinha d'angola. Eu gosto de animais e mais ainda dos esquisitos e invulgares, até dos que parecem feios por serem indispostos.
    Os bichos só são feios se não entendermos seus padrões de beleza. Um pouco como as pessoas. Ser feio é complexo e pode ser apenas um problema de quem observa.
        Eu uso óculos desde os cinco anos de idade. Estou sempre por detrás de uma janela de vidro. Não faz mal, é porque eu inteira sou a minha própria casa. Sou como o caracol, mas muito mais alta e veloz. A minha mãe também acha assim, que o corpo é casa. Habitamos com maior ou menor juízo."



domingo, 9 de novembro de 2014

Solução


"O amor precisa ser uma solução, não um problema. Toda 
a gente me diz: o amor é um problema. Tudo bem. Posso
dizer de outro modo: o amor é um problema mas a pessoa 
amada precisa ser uma solução."


"O paraíso são os outros" - Valter Hugo Mãe.

Uma criança reflete sobre o amor


                                                Com Américo Rodrigues, Biba Rigo, no show Tonho Penhasco Trio - 1.11.14


Uma criança reflete sobre o amor...


"Reparei desde pequena que os adultos vivem muito em casais. Mesmo que nem sempre sejam óbvios, porque algumas pessoas têm par mas andam avulsas como as solteiras, há casais de mulher com homem, há de homem com homem e outros de mulher com mulher. Há também casais de pássaros, coelhos, elefantes, besouros, pinguins - que são absurdamente fiéis -, quero dizer: há casais de pinguins, e até golfinhos podem ser casais. Tudo por causa do amor.
   O amor constrói. Gostarmos de alguém, mesmo quando estamos parados durante o tempo de dormir, é como fazer prédios ou cozinhar para mesas de mil lugares.
   Mas amar é um trabalho bom. A minha mãe diz."

Do livro "O paraíso são os outros" - Valter Hugo Mãe



 

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

O paraíso são os outros

Vilma Gama e Valter Hugo Mãe. Noite de autógrafo do livro O paraíso são os outros, na Central Galeria de Arte - 6.11.14 Foto: Isa Prates

Aconteceu ontem (6) a noite de autógrafo do livro "O paraíso são os outros" de Valter Hugo Mãe, na Central Galeria de Arte, em São Paulo. O livro fala sobre o amor, sob a ótica de uma criança.
Surpresa feliz encontrar o escritor Ignácio de Loyola Brandão no meio de uma multidão de estranhos. Quando o reconhecemos e ele ouviu que falávamos dele, veio logo e conversou conosco como se fôssemos amigos. Estava com a esposa e disse para vermos algo no final do livro do Valter.
Ignácio de Loyola Brandão e Vilma Gama - abril de 2013 - Foto: Gedeão Dias

Curiosas fomos ver o que havia no final do livro e achamos o seguinte na Nota do Autor: "O paraíso são os outros vai todo dedicado à minha querida Olga Antonieta Almeida, mas guarda um forte abraço ao grande Ignácio de Loyola Brandão, de quem assisti a uma das mais belas declarações de amor, naturalmente feita à sua esposa, querida Márcia Gullo. Ignácio disse que, se pudesse voltar atrás, não sabia o que mudaria na sua vida. Disse, no entanto, saber o que não mudaria nunca: o amor por Márcia. Todos quantos ouvimos achamos ter acontecido ali, de modo espontâneo, a mais preciosa das situações da vida." Valter Hugo Mãe.

O livro O paraíso são os outros - Central Galeria de Arte - Foto: Isa Prates

Vilma Gama e Isa Prates com os livros autografados em Central Galeria de Arte - Foto: Vilma Gama


"Os casais formam-se para serem o paraíso. Ao menos, assim devia ser. Há casais que vivem num inferno, mas isso está errado. Pertencer a um casal tem de ser uma coisa boa. Eu, quando for adulta e encontrar que vou amar, vou querer ser feliz. Não vou nem ter paciência para quem me impedir. Precisamos fugir de toda a maldade antes que não saibamos mais fugir. A maldade tem de ser acabada logo na primeira situação..."

"O paraíso são os outros" - Valter Hugo Mãe

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Um mês

                                                                                                                                                                                      Foto: Barry Ennor


Ontem (5) o blog Dizeres Poéticos completou um mês de 

existência.

Para comemorar e retomar as publicações, o poeta-alvo do mês Manoel de Barros nos diz:



"Sobre meu corpo se deitou a noite (como se 

eu fosse um lugar de paina).

Mas eu não sou um lugar de paina.

Quando muito um lugar de espinhos.

Talvez um terreno baldio com insetos dentro.

Na verdade eu nem tenho ainda o sossego de

uma pedra.

Não tenho os predicados de uma lata.

Nem sou uma pessoa sem ninguém dentro -

feito um osso de gado

Ou um pé de sapato jogado no beco.

Não consegui ainda a solidão de um caixote -

tipo aquele engradado de madeira que o poeta

Francis Ponge fez dele um objeto de poesia.

Não sou sequer uma tapera, Senhor.

Não sou um traste que se preze.

Eu não sou digno de receber no meu corpo os

orvalhos da manhã."