segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Despalavra: a palavra incapaz de ocupar o lugar de uma imagem


                                                                                                                                                                                     Foto: Vilma Gama


Nessa poesia Manoel de Barros debruça-se sobre a palavra, desvenda seus mistérios. Caminhos encantados pelo poeta em seus 74 anos de trabalho.


"Agora só espero a despalavra: a palavra nascida

para o canto - desde os pássaros.

A palavra sem pronúncia, ágrafa.

Quero o som que ainda não deu liga.

Quero o som gotejante das violas de cocho.¹

A palavra que tenha um aroma ainda cego.

Até antes do murmúrio.

Que fosse nem um risco de voz.

Que só mostrasse a cintilância dos escuros.

A palavra incapaz de ocupar o lugar de uma

imagem.

O antesmente verbal: a despalavra mesmo."



Manoel de Barros



¹Estão registrados nas anotações antropológicas do mestre Roquete Pinto os
sons gotejantes da viola de cocho. A expressão é conhecida entre os índios
guatós da beira do Cracará. A viola de cocho é levianinha e só tem quatro
cordas feitas de tripa de bugio. É com ela que se acompanha o cururu,
dança de origem indígena, disseminada entre os ribeirinhos do Cuiabá e
do rio Paraguaio.

domingo, 16 de novembro de 2014

José Saramago - Janela da Alma

Hoje (16) o escritor português José Saramago completaria 92 anos. Nascido na aldeia de Azinhaga, província de Ribatejo, em 16 de novembro de 1922, ele faleceu em  18 de junho de 2010.
Saramago recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1998.
Escreveu o maravilhoso livro "Ensaio sobre a cegueira".
No  documentário "Janela da Alma" (2002), de João Jardim e Walter Carvalho, Saramago fala sobre a cegueira e sobre o sentido mais privilegiado pela humanidade, a visão. Neste trecho do filme há também o depoimento do cineasta Win Wenders. 



"Estamos a destruir o planeta e o egoísmo de cada geração

 não se preocupa em perguntar como é que vão viver os que


 virão depois. A única coisa que importa é o triunfo do agora.


 É a isto que eu chamo a cegueira da razão."



José Saramago

sábado, 15 de novembro de 2014

Baby do Brasil - Telúrica





                Baby do Brasil, Américo Rodrigues e Vilma Gama ontem (14) no camarim da cantora no Grand Metrópole

Convidada por Tulipa Ruiz, Baby do Brasil deu um show no Grand Metrópole, em São Paulo. O presente foi nosso, conversamos com a Baby que nos atendeu gentilmente em seu camarim. Seu talento, carisma e simplicidade nos encantou. "Eu vejo o mar e penso em ti/ mandes prana para mim... para ser telúrica... A ideia ilumina dá o toque e anima, o aroma do perfume, o lume do vagalume/ o pensamento das flores, significado das cores para ser telúrica, para ser telúrica..."
Significados: 
Telúrica: (adjetivo) - Da Terra ou a ela relativo. Relativo  ao solo.
Prana: (subst. masc.) (sânscrito) - O princípio da vida.



"Telúrica"


"Vejo o sol e penso em ti 

Mandes prana para mim 

Que esses raios de ouro cor

Penetrem nos meus chacras me


Colorindo de amor


Vejo o mar e penso em ti


Mandes prana para mim


Que esse espelho - luz fulgor


Penetre nos meus chacras


Numa onda de amor


Fecho os olhos entrego o ser


Para ser telúrica


Alma e corpo compreender


Para ser telúrica


Penso em ti no meu agir


Para ser telúrica


Não aceito preconceito


Para ser telúrica


Para ser telúrica



A idéia ilumina


Dá o toque e anima


O aroma do perfume


O lume do vagalume


O pensamento das flores


Significado das cores


Para ser telúrica


Para ser telúrica"


Baby do Brasil

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Procure ser árvore





"As árvores velhas quase todas foram preparadas

para o exílio das cigarras.

Salustiano, um índio guató, me ensinou isso.

E me ensinou mais:  Que as cigarras do exílio

são os únicos seres que sabem de cor quando a

noite está coberta de abandono.

Acho que a gente deveria dar mais espaço para

esse tipo de saber.

O saber que tem força de fontes."


Manoel de Barros







quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Só Dez Por Cento é Mentira



"Só dez por cento é mentira" (2008) é um documentário de Pedro Cezar sobre a biografia inventada de Manoel de Barros. Eu me emocionei o tempo inteiro. Imperdível.







Até logo Manoel de Barros



Hoje (13) faleceu o poeta Manoel de Barros, aos 97 anos, em Campo Grande - MS. Passou a infância no Pantanal. Cresceu tornou-se advogado, depois fazendeiro, táticas para poder exercer sempre seu verdadeiro ofício: poeta. Viveu para as palavras.
    O blog Dizeres Poéticos nasceu por culpa de Manoel de Barros. No final de setembro caiu em minhas mãos o livro "Retrato do artista quando coisa", aí a magia começou e continuo para sempre encantada com o melhor poeta do século XX, assim o considerava Carlos Drummond de Andrade.
     Fausto Wolff, que apresenta o livro "Retrato do artista quando coisa"  falou sobre o amigo: "Este é o sujeito que vê uma letra e a entorta. Depois fica vigiando até descobrir para que ela não serve. E a falta de serventia da letra que Manoel entortou descongela o nosso cérebro, atiça nossa visão, nos redimensiona." Segundo Fausto: "Manoel tem com os trovões, ventos e crepúsculos, a intimidade que Drummond tinha com fenômenos urbanos. Manoel é incomparável; está longe dos demais poetas. Mais fácil compará-lo a Picasso e De Kooning, os grandes decompositores de artes plásticas que, como ele, dessencializavam a forma até torná-la pura. Suas metáforas cumprem a função das metáforas: expandem a nossa imaginação."

Livros publicados:

“Poemas concebidos sem pecado” (1937)

“Face imóvel” (1942)

“Poesias” (1956)

“Compêndio para uso dos pássaros” (1960)

“Gramática Expositiva do Chão” (1966)

“Matéria de Poesia” (1974)

“Arranjos para Assobio” (1980)

“Livro de Pré-Coisas” (1985)
“O Guardador de Águas” (1989)
“Poesia Quase Toda” (1990)
“Concerto a Céu Aberto para Solos de Ave” (1991)
“O Livro da Ignorãças” (1993)
“Livro Sobre Nada” (1996)
Retrato do Artista Quando Coisa” (1998)
“Ensaios Fotográficos” (2000)
“Exercícios de Ser Criança” (2000)
“Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo” (2001)
“O Fazedor de Amanhecer” (2001)
“Poeminhas Pescados numa Fala de João” (2001)
“Cantigas para Um Passarinho à Toa” (2003)
“Memória Inventadas” (2003)
“Poemas Rupestres” (2004)
“Memória Inventadas II – A Segunda Infância” (2005)
“Poeminha em Língua de Brincar” (2007)
“Memória Inventadas III – A Terceira Infância” (2007)
 “Menino do Mato” (2010)
"Escritos em Verbal de Ave" (2011)
O último poema escrito em 2013 "A turma" está no livro:
"A biblioteca de Manoel de Barros" (2013) - Obra completa do poeta lançado pela editora Leya.
Cercado por bons sentimentos vindos da família, dos amigos, dos livros e de seus encantados leitores, presentes ou não, o poeta nascido em 19 de dezembro de 1916 se despede hoje (13 de novembro de 2014) do planeta Terra. Missão cumprida.

Para a participação da poesia

Vista da janela da sala                                                                                                                                                Foto: Vilma Gama


Para o que somos feitos? Eis a indagação de muitos seres humanos. A reflexão sobre a própria existência é coisa da espécie humana. As outras espécies são imortais.
Por isso destaco este belíssimo poema de Vinícius de Morais, uma luz para nos conduzir em nossas reflexões.


"Poema de Natal"


"Para isso fomos feitos:

Para lembrar e ser lembrados

Para chorar e fazer chorar

Para enterrar os nossos mortos -

Por isso temos braços longos para os adeuses

Mãos para colher o que foi dado

Dedos para cavar a terra.



Assim será a nossa vida:

Uma tarde sempre a esquecer

Uma estrela a se apagar na treva

Um caminho entre dois túmulos -

Por isso precisamos velar

Falar baixo, pisar leve, ver

A noite dormir em silêncio



Não há muito que dizer:

Uma canção sobre um berço

Um verso, talvez de amor

Uma prece por quem se vai - 

Mas que essa hora não esqueça

E por ela os nossos corações

Se deixem, graves e simples.




Pois para isso fomos feitos:

Para a esperança no milagre

  Para a participação da poesia       

Para ver a face da morte -

De repente nunca mais esperaremos...

Hoje a noite é jovem: da morte, apenas

Nascemos, imensamente."