quinta-feira, 2 de março de 2017

A vida tem sempre razão - Vinícius de Moraes e Toquinho





O poetinha Vinícius de Moraes e seu escudeiro Toquinho,

 poesia e música atemporais, ontem, hoje e sempre.

Poesia e música para a alma e o corpo.



domingo, 21 de agosto de 2016

José Saramago - falsa democracia

Jornalista, poeta, escritor e Prêmio Nobel de Literatura, José Saramago destaca suas reflexões sobre democracia
              
O governo antidemocrático que se instalou em nosso país 

completou 100 dias, na última sexta (19). 

A marionete que o representa (Michel Temer) foi vaiado na 

abertura do espetáculo mundial - as Olimpíadas 2016. 

Vergonhosamente, não estará presente, hoje,  no 

encerramento do evento. 

O mundo (a imprensa internacional) reconhece

  que houve um golpe, ao contrário da imprensa nacional 

(panfletária,  antidemocratica, corrupta, vendida), que insiste

 em chamar de "governo interino". Enquanto isso, a 

presidenta Dilma Rousseff, democraticamente eleita com 54 

milhões de votos, continua afastada.

 Os níveis de cinismo são 

imensuráveis nesse momento da história do Brasil.

Democracia!

Carinho e atenção com a palavra democracia, pois

precisamos, urgente,  resgatar seu significado

Segundo o grande filósofo chinês, Confúcio,  quando 

as palavras perdem seu significado, pessoas perdem

sua liberdade. 

A utopia é que esse seja um resgate em massa

que atinja o maior número de pessoas possível.

Saramago profetizou o momento atual vivido em nosso 

país:

"a democracia que vivemos é uma democracia sequestrada,

 condicionada, amputada, porque o poder do cidadão,

o poder de cada um de nós limita-se, na esfera política,

a tirar um governo de que não gosta para por outro, que 

talvez venha a gostar, nada mais!

Mas, as grandes decisões são tomadas numa outra

 esfera, e todos nós sabemos qual é (as grandes 

organizações financeiras internacionais, os FMIs, 

as organizações mundiais de comércio, os bancos 

mundiais, nenhum desses organismos é democrático.

E, portanto, como é que podemos continuar a falar de

democracia, se aqueles que efetivamente governam

o mundo não são eleitos democraticamente pelo povo.

Quem escolhe os representantes dos países nessas ~

organizações? O povo? 

Onde está, então, a democracia?"


José Saramago

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Um poema para meu pai




Há duas décadas mais um ano Lourival Pereira Gama (meu

pai, nesta minha atual experiência humana) deixou o 

planeta.

Nessa manhã nublada (e fria) de 2 de agosto de 2016, um 

poema para acariciar a memória de sua existência por 72

anos na Terra.

Laços de gratidão e amor nos mantém unidos pela 

eternidade!*



Bellini e Pablo também

 Para o Alberto Lacerda



Alberto  Alberto

como os números enganam



Você completou setenta

setenta anos de vida

três vezes mais de vivências

metade no coração



                                    não diga nada já sei

você vai-me responder

                            (citando Yeats)

que o coração envelhece



mas não o seu

o seu não



O seu floresce todas as manhãs

mesmo quando o tempo é mau



e como o tempo agreste o martiriza



toca o telefone

                   é você



: já viu o tempo como está?

uma coisa pavorosa

                                           não se aguenta



mas a conversa prossegue

e o seu clima interior levanta logo

começa                   

           a resplandecer  



você nisso é singular Alberto



nisso e muitas outras coisas



o seu spaghetti com peixe

                  por exemplo



quase ninguém acredita

- o Alberto a cozinhar?  



e que gosto você põe

em fazer condimentos de alcaparras

                         você desencanta sítios para as comprar



você desencanta tudo

Victoria Square

         (um assombro)

                                                   Paris no centro de Londres



e a pia baptismal de William Blake

     e poetas que nunca foram publicados

 e as galerias de arte de Mayfair 



estou em crer que elas estão lá

só por si                                   

        para lhe agradar                              



toca o telefone                        



o telefone para nós dois 

tornou-se fundamental



trim  trim

                       é você de longe

                               Londres Boston Nova Iorque



: acabo de vir do MoMA

você não pode perder

a exposição que lá está



primeiro as suas recomendações

: vá cedo

                         não perca tempo

                 a exposição

é exigentíssima    imensa

                tem que ser vista com o maior rigor



depois vem o conversete

palavra sua                    

    hoje nossa

            interrompido por mil divagações

porque como                 

você diz

          você escreveu

                                   num poema que inspirou Octavio Paz

                                 conversar é divino



e tem razão



e às vezes você anoitece

  são nuvens         sombras

             o exílio

    tantos exílios                    



                            ninguém pode sequer imaginar               



e noutras ocasiões a gente liga

 e o telefone toca          toca      

       e você sem responder                   



: não ouvi

                                        estava a ouvir música



esclarece você depois         



e a seguir                           

                                   : espere um momento



              os seus momentos são eternidades



o auscultador pousado

  apanha um leve tossir   

 um breve passarinhar  



e de novo a sua voz



: está com paciência?

       posso ler-lhe um poema?

                          escrito no Café Picasso esta manhã? 



é claro que pode       Alberto

          você pode sempre        Alberto      

               você com essa até me faz lembrar      

         a preta Irene do Manuel Bandeira



Manuel

                       poeta querido

                                     amigo seu



tantos amigos

  tantas

                        amizades



e a nossa também        Alberto

          que vai crescendo e permanece igual

que vence fusos horários         

para dar vivas a Bellini            

                   Bellini e Pablo também



que é local     inter-urbana

e atravessa continentes

e em nome da qual pergunto



: tem paciência para ler isto?



é uma cantiga de amigo

que lhe dedica             

                         a Vinte de Setembro

o seu                         

                  mais do que amigo

                                                       irmão 
              Luís

Poema de Luís Amorim de Sousa in Bellini e Pablo também, 2007. Este poema foi escrito em antecipação da data de 20 de setembro

* Lourival Pereira Gama deixou o planeta em 1º de agosto de 1995.                             

quarta-feira, 13 de julho de 2016

quinta-feira, 30 de junho de 2016

O MEDO AMEAÇA - por EDUARDO GALEANO


                                                                                                                                                                                      Foto: Vilma Gama

"O medo ameaça

se você ama, terá Aids

se fuma, terá câncer

se respira, terá contaminação

se bebe, terá acidentes

se come, terá colesterol

se fala, terá desemprego

se caminha, terá violência

se pensa, terá angústia

se duvida, terá loucura

se sente, terá solidão"



Eduardo Galeano

quarta-feira, 15 de junho de 2016

A alma é uma borboleta - Rubem Alves



"A alma é uma borboleta...

Há um instante em que

uma voz nos diz

que chegou o momento

de uma grande

metamorfose."


Rubem Alves

domingo, 29 de maio de 2016

Tarde de maio - Carlos Drummond de Andrade

Pavão no Parque da Água Branca                                                                                                                          Foto: Vilma Gama

Tarde de Maio



Como esses primitivos que carregam por toda parte o

maxilar inferior de seus mortos,

assim te levo comigo, tarde de maio,

quando, ao rubor dos incêndios que consumiam a terra,

outra chama, não perceptível, tão mais devastadora,

surdamente lavrava sob meus traços cômicos,

e uma a uma, disjecta membra, deixava ainda palpitantes

e condenadas, no solo ardente, porções de minh'alma

nunca antes nem nunca mais aferidas em sua nobreza

sem fruto.



Mas os primitivos imploram à relíquia saúde e chuva,

colheita, fim do inimigo, não sei que portentos.

Eu nada peço a ti, tarde de maio,



senão que continues, no tempo e fora dele, irreversível,

sinal de derrota que se vai consumindo a ponto de

converter-se em sinal de beleza no rosto de alguém

que, precisamente, volve o rosto e passa...

Outono é a estação em que ocorrem tais crises,

e em maio, tantas vezes, morremos.




Para renascer, eu sei, numa fictícia primavera,

já então espectrais sob o aveludado da casca,


trazendo na sombra a aderência das resinas fúnebres

com que nos ungiram, e nas vestes a poeira do carro

fúnebre, tarde de maio, em que desaparecemos,

sem que ninguém, o amor inclusive, pusesse reparo.


E os que o vissem não saberiam dizer: se era um préstito

lutuoso, arrastado, poeirento, ou um desfile carnavalesco.

Nem houve testemunha.


Nunca há testemunhas. Há desatentos. Curiosos, muitos.

Quem reconhece o drama, quando se precipita, sem 

máscara? 

Se morro de amor, todos o ignoram

e negam. O próprio amor se desconhece e maltrata.

O próprio amor se esconde, ao jeito dos bichos caçados;

não está certo de ser amor, há tanto lavou a memória

das impurezas de barro e folha em que repousava. E resta,

perdida no ar, por que melhor se conserve,

uma particular tristeza, a imprimir seu selo nas nuvens."


Carlos Drummond de Andrade