sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A poesia de Alberto Caeiro. Flores sentem? Pedras têm alma?

Vegetação nativa - Farol de Santa Marta - SC                                                                                                                Foto: Vilma Gama


"Li hoje quase duas páginas


Do livro dum poeta místico,

E ri como quem tem chorado muito.


Os poetas místicos são filósofos doentes,

E os filósofos são homens doidos.


Porque os poetas místicos dizem que as flores sentem

E dizem que as pedras têm alma

E que os rios têm êxtases ao luar.


Mas as flores, se sentissem, não eram flores,

Eram gente;

E se as pedras tivessem alma, eram cousas vivas, não eram

pedras;

E se os rios tivessem êxtases ao luar,

Os rios seriam homens doentes.


É preciso não saber o que são flores e pedras e rios

Para falar dos sentimentos deles.

Falar da alma das pedras, das flores, dos rios,

É falar de si próprio e dos seus falsos pensamentos.

Graças a Deus que as pedras são só pedras, 

E que os rios não são senão rios,

E que as flores são apenas flores.


Por mim, escrevo a prosa dos meus versos

E fico contente,

Porque sei que compreendo a natureza por fora;

E não a compreendo por dentro

Porque a Natureza não tem dentro;

Senão não era a Natureza."

                                         Alberto Caeiro

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