domingo, 26 de abril de 2015

Auge - Paulo Leminski

                                                                                                                                                                                        Os Alpes Suíços
"Auge"


"Me chega em forma de vozes

palavras velozes, agudos de aves,

me chega com anos de atrasos e planos,

me chega com ecos, palácios perdidos,

nuvens, zumbidos, subterrâneos.



Chega de evasivas, chega de frases vazias.

Chega de ver fantasmas ao meio-dia.

Chega de carnaval, chega de fantasia,

chega de fazer conta

que Atlântida existia.



Chega. Tudo chega. Chega o auge.

O que eu sou me chega." 

                                                     Paulo Leminski




sábado, 25 de abril de 2015

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Leminski


  "Acordei bemol"



  "Acordei bemol


tudo estava sustenido sol fazia


só não fazia sentido."

                                                                          Paulo Leminski



quinta-feira, 23 de abril de 2015

Um dia... - Paulo Leminski



"um dia

a gente ir ser  homero

a obra nada menos que uma ilíada



depois


a barra pesando


dava pra ser aí um rimbaud


um ungaretti um fernando pessoa qualquer


um lorca um éluard um ginsberg





por fim


acabamos o pequeno poeta de província


que sempre fomos


por trás de tantas máscaras


que o tempo tratou como a flores."



                                                                       Paulo Leminski


                                                           Paulo Leminski
                                                    

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Quem dera eu achasse um jeito de fazer tudo perfeito - Paulo Leminski

                                          

Sujeito indireto


Quem dera eu achasse um jeito

de fazer tudo perfeito,

feito a coisa fosse o projeto

e tudo já nascesse satisfeito.

Quem dera eu visse o outro lado,

o lado de lá, lado meio,

onde o triângulo é quadrado

e o torto parece direito.

Quem dera um ângulo reto.

Já começo a ficar cheio

de não saber quando eu falto,

de ser, mim, indireto sujeito."

Paulo Leminski

Sem compromisso

Baleia-de-Bryde almoça um cardume de sardinhas  na Península da Baixa Califòrnia - México                                             Foto: Doug Perrine
Sardinha 

excesso de espinha

Então por que comê-la desta vez?

Bastante ômega três.

                                      Vilma Gama



terça-feira, 21 de abril de 2015

Ó 21 de abril, que intrigas de ouro e sonho, houve em tua formação? - Cecília Meireles



"Romanceiro da Inconfidência" (trecho) 

"Fala inicial"

"Não posso mover meus passos

Por esse atroz labirinto

De esquecimento e cegueira

Em que amores e ódios vão:

- pois sinto  bater os sinos,

percebo o roçar das rezas,

vejo o arrepio da morte,

à voz da condenação;



                                                A pintora  Cecília Meireles

- avisto a negra masmorra

e a sombra do carcereiro

que transita sobre angústias,

com chaves no coração;

- descubro as altas madeiras

do excessivo cadafalso

e, por muros e janelas,

o pasmo da multidão.

Batem patas de cavalos.

Suam soldados imóveis.

Na frente dos oratórios,

que vale mais a oração?

Vale a voz do Brigadeiro

sobre o povo e sobre a tropa,

louvando a augusta Rainha,

- já louca e fora do trono -

na sua Proclamação.


             A poetisa Cecília Meireles

Ó meio-dia confuso,

ó vinte-e-um de abril sinistro,

que intrigas de ouro e de sonho

houve em tua formação?

Quem condena, julga e pune?

Que é culpado e inocente?

Na mesma cova do tempo

Cai o castigo e o perdão.

Morre a tinta das sentenças

e o sangue dos enforcados...

- liras, espadas e cruzes

pura cinza agora são.

Na mesma cova, as palavras,

e o secreto pensamento,

as coroas e os machados,

mentiras e verdade estão.

Aqui, além, pelo mundo,

ossos, nomes, letras, poeira...


                                     A escritora Cecília Meireles

Onde, os rostos? onde, as almas?

Nem os herdeiros recordam

rastro nenhum pelo chão.

Ó grandes muros sem eco,

presídios de sal e treva

onde os homens padeceram

sua vasta solidão...


                                           A professora Cecília Meireles

Não choraremos o que houve,

nem os que chorar queremos:

contra rocas de ignorância

rebenta nossa aflição.

Choraremos esse mistério,

esse esquema sobre-humano,

a força, o jogo, o acidente

da indizível conjunção

que ordena vidas e mundos

em pólos inexoráveis

de ruína e de exaltação.

Ó silenciosas vertentes

por onde se precipitam

inexplicáveis torrentes,

por eterna escuridão!
                                                                    Foto: Vilma Gama

... "Romance XXIV ou Da bandeira da Inconfidência" (trecho)

Cavalo de La Fayette

saltando vastas fronteiras!

Ó vitórias, festas, flores

das lutas da Independência!


                    A jornalista Cecília Meireles

Liberdade - essa palavra

que o sonho humano alimenta:

que não há ninguém que explique,

e ninguém que não entenda!


E a vizinhança não dorme:

murmura, imagina, inventa.

Não fica bandeira escrita,

mas fica escrita a sentença."

                                            Cecília Meireles